Um texto atribuído ao escritor Gabriel Chalita diz o seguinte:
“… nós não estamos prontos, mas em construção. Tijolo a tijolo, o templo da nossa história vai ganhando forma.
Em alguns momentos, não somos capazes de compreender o tamanho da dor. Em outros, a edificação parece mais leve, o amor alivia o árduo trabalho. E assim é a nossa vida.
… o outro, o meu irmão, também está em construção e também causa transtornos. E, às vezes, um tijolo cai e me machuca.
Outras vezes, é o cal ou o cimento que suja o meu rosto. E quando não é um, é outro. E o tempo todo tenho de me limpar e cuidar das feridas. Assim como os outros que convivem comigo também têm de fazer…”
Toda vez que vejo alguém se manifestando contra a luta de grupos mais vulneráveis ou rotulando a dor do outro de “mimimi” lembro desses fragmentos que resumem uma constatação óbvia: todos nós estamos em construção.
Essa frase se tornou uma terapia pra mim, já que o caminho mais fácil seria sentir raiva de quem julga os outros.
Será que é preciso ser negro pra se colocar na pele de quem sofre racismo?
Será que é preciso ser mulher pra perceber que o mundo ainda é desigual quando se trata de gênero? Conheço muitas que nem despertaram.
Será que é preciso ser homossexual pra entender que cada ser humano é único, complexo e tem total liberdade de viver a sua história como quiser, desde que não prejudique ninguém?
Será que é preciso ser trans pra reconhecer o direito que essas pessoas têm de respirar o mesmo ar que nós?
A resposta para todas essas perguntas é NÃO.
Não precisa tudo isso. Basta ter a sensibilidade de um ser humano de verdade.
Lutar por direitos não é o mesmo que exigir privilégios
Se você acha que o mundo não é mais o mesmo, está coberto de razão. Afinal, a tecnologia invadiu as nossas vidas, a internet revolucionou a comunicação e resultou em novas formas de comportamento.
Mas, acima de tudo, ainda somos humanos. Quando estamos em construção, fazemos muito barulho, poeira, quebradeira. Tudo isso é necessário pra concluir a obra.
O problema é que tem muita obra parada. Eu vou dar um exemplo. Hoje, as piadas que colocam os grupos vulneráveis dentro de um contexto depreciativo/humilhante não têm graça. Mas, durante muito tempo foi engraçado.
Será que o mundo ficou mais chato?
Não. O que aconteceu foi uma evolução. O reconhecimento de que certas piadas de mau gosto contribuem para alimentar o ódio, o preconceito, a violência, a depressão, a ansiedade, o suicídio e o assassinato de pessoas a níveis alarmantes.
Elas estão sofrendo as consequências daqueles que se negam a continuar a própria construção. Simplesmente pararam no tempo, abandonaram a obra.
Como Chalita destacou: “o amor alivia o árduo trabalho”, mas o amor não é pra qualquer projeto inacabado, não.
* Monique Gomes é jornalista freelancer certificada em Marketing de Conteúdo, feminista, cinéfila e livre de glúten.