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A fantástica história dos indígenas Mussaperê e Herundi

Revista de Entretenimento

No e-book A Surpreendente História de Uba e Jara, há um capítulo em que menciono a Jacutinga, “uma casa de entretenimento para adultos” que existia no sítio Buriti, em Ubajara.

No conto, os indígenas Mussaperê e Herundi são a atração da noite com voz e violão.

Você sabia que ambos existiram na vida real?

Mussaperê e Herundi: conheça a história de Los Tabajaras

Mussaperê e Herundi: a história dos indígenas tabajaras na Revista de Entretenimento Blog da Monique

A dupla de indígenas Mussapere e Herundi, mais conhecida como “Los Índios Tabajaras”, nasceu na Serra da Ibiapaba, segundo fontes da internet, no município de Tianguá.

Na década de 30 percorreram o Brasil à pé, viajaram o mundo e conquistaram sucesso definitivo nos EUA como consagrados instrumentistas.

Ambos gravaram mais de 70 álbuns e venderam milhões de discos.

Entrevista Cultura FM em 2009

Confira esta entrevista produzida pelo jornalista Fábio Zanon, da Rádio Cultura FM, Rio de Janeiro, três anos antes da morte de Mussapere, fato que aconteceu em novembro de 2009

Como Mussapere e Herundi praticamente não tiveram uma carreira no Brasil antes da carreira nos Estados Unidos, dizia-se que eram mexicanos, que não eram índios, era um espetáculo sem valor artístico fabricado para explorar a ingenuidade dos ouvintes.

Apesar do teor comercial da maioria de suas gravações a qualidade de sua técnica e uma assombrosa musicalidade e combustão nas suas interpretações não podiam ser em nenhuma hipótese ser uma falsificação. O hábito de desaparecer por longos períodos acabou por alimentar ainda mais a mitologia.

Essa oportunidade única de conversar com Mussapere, longe de esclarecer ou provar o que quer que fosse, foi um mergulho numa trajetória tão extraordinária que torna irrelevante fato e ficção. Mussapere e Herundi, de fato, não haviam visto o homem branco ou a língua portuguesa até a idade aproximada de 10 anos.

Mussapere, ou Nato Lima, como é conhecido nos Estados Unidos, hoje tem por volta de 89 anos, já que o seu povo não celebrava aniversário.

“Eu fui nascido na Tribo Tabajara. Sou filho de um dos guerreiros tabajaras chamado UGAJARA. Nós saímos porque um coronel, naquele tempo era Tenente Moreira Lima, e então ele foi para lá em 1928 para parar a tropa que vinha do Piauí para tomar o Ceará porque não tinha governador, não tinha nada. Havia muito cangaceiro e muita coisa do Juazeiro, mas durante aquele tempo que ele foi para lá ele fez amizade conosco porque o corneteiro era um pretinho com dente de ouro e tocava corneta e nós todos gostávamos”.

“Nunca tinha visto homem branco, nem preto, nem som de corneta. Não falávamos português, só o tupi. Fizemos amizade num dia de manhã e no outro dia o grupo de soldados todo desapareceu. Para nós foi um dia muito feio porque nós estávamos acostumados com ele.

Meu pai disse: ‘Nós vamos abrir a trilha’ e depois descemos para um lugar chamado Ubajara e fomos caminhando pelo sertão seco, lá em cima era bonito, muito verde. Nós tínhamos um violão que havíamos encontrado lá em cima. Saindo do norte do Brasil passamos dois anos no sertão de Cariri, ali aprendemos português pouco a pouco. Meu pai nunca aprendeu”.

Mussaperê e Herundi em Sobral

“Quando chegamos num lugar chamado Sobral vindo da Serra da Ibiapaba caminhando mais ou menos 4 ou 5 dias, nós chegamos a Sobral. Já havia visto gente branca, gente preta, já estávamos vestindo roupa de gente civilizada, porque nós andávamos nus, e causou grande confusão lá em Ibiapina. Um cachorro me mordeu, nós nunca havíamos visto cachorro. Chegamos a Mucambo, um lugar muito pequeno, trabalhamos três dias na Casa de Farinha. Ninguém dormiu durante esses três dias”.

“Ganhamos dinheiro, então o camarada nos levou de caminhão, também nunca havíamos visto caminhão. Tinha uns porcos dentro do caminhão e cheirava muito mal por causa da gasolina. Nós montamos no caminhão e ele nos levou até Fortaleza, capital enorme”.

Mussaperê e Herundi em Fortaleza

“Quando chegamos em Fortaleza vimos edifícios enormes de sete andares mas depois um sujeito nos levou lá pra cima e nos mostrou o banho, com privada e chuveiro bummm, ai que coisa muito interessante e então ele nos levou lá fora e vimos o horizonte azul. Era o mar, nós nunca tínhamos visto o mar”.

Mussaperê e Herundi em Natal

“Fomos até Natal, porque lá tinha navio que podia dar passagem de graça para o Rio de Janeiro. Fomos até Natal, levamos dez dias pra chegar lá à pé. Chegando em Natal passamos uns 20 dias e não conseguimos, então saímos à pé e levamos 3 anos para chegar no Rio de Janeiro à pé”.

“Nós éramos 6 irmãos com capacidade de ganhar dinheiro, mas não tínhamos capacidade, não sabíamos ler. Nós tocávamos músicas indígenas, o povo gostava e as pessoas jogavam moedas. Assim nós ganhamos dinheiro e até compramos uma casa…”.

Mussaperê e Herundi no Chile

Até o início da carreira, no rádio, no Rio, eles eram totalmente autodidatas, não sabiam ler música, aparentemente um produtor levou-os a tocar no Chile e lá Mussapere entrou em contato com a música clássica pela primeira vez.

“Mas nós não tínhamos na mente aquela finura que exigia a música, nós tocávamos o que podíamos de qualquer maneira. Depois de chegarmos ao Chile, foi que nós aprendemos sobre a música clássica. Um menino disse: ‘você vai escutar a música mais bonita do mundo’ e botou A Fantasia Improviso, de Chopin”.

“Eu disse: ‘mas que maravilha, que bonito, aquele violão não tem a extensão que tem o piano’. Eu aprendi sozinho, sem a escola, estudando anos e anos, dia e noite, porque eu queria ser bom. Quando eu aprendi a tocar com os dedos, na Escola de Segóvia, tocava também com a palheta, que é muito rápida”.

Depois de rodar a América Latina, eles voltaram em 1953 para São Paulo e foram contratados brevemente pela Rádio Gazeta, mas logo em seguida gravaram os primeiros discos e rumaram com a vaga intenção de atingir os Estados Unidos.

Veja também:

Mussaperê e Herundi nos EUA

Show dos índios Tabajaras Mussaperê e Herundi nos EUA em novembro 1977
Show dos índios Tabajaras nos EUA em novembro 1977, registro de Ramachrisna Parente da Costa.

“Nós conseguimos um contrato para Porto Rico e sentimos vontade de ir até Nova Iorque. Tínhamos um pouco de dinheiro e fomos. Chegamos em Nova Iorque e achamos um hotel muito barato. Depois na 47 eu e meu irmão estávamos jogando bola de neve, tinha uma nevada de um metro de altura. Estávamos jogando bola de neve um contra o outro quando a bola pegou num camarada que deu pra dar pena, aí ele disse assim: ‘Nato!’ Ele me chamou de Nato. ‘Mussapere!’. Mussapere é meu nome”.

“Assim ele tirou o boné, um antigo amigo nosso que tínhamos emprestado dinheiro a ele para que viesse aos Estados Unidos. Depois fomos a RCAVictor , não podemos contratar porque não é uma casa de filantropia, ele disse: ‘olha, eu não posso trazer os índios aqui sem lhe mostrar como eles tocam, porque eles são muito bons, são fantásticos. Mas, aqui não dá dinheiro não, na América eles gostam de pop, isso é que dá dinheiro”.

A consagração nos Estados Unidos não foi imediata. O disco não vendeu o esperado e eles tiveram que conquistar antes a popularidade no rádio e na tv. Para tal, o exotismo de sua apresentação foi decisivo.

”Nós fomos numa estação de tv, programa de Artur Garfield, e lá entramos em competição com um grupo de Texas e uma loira bonita daquelas desastrosas. Entramos no programa tocando Dança Ritual do Fogo. Ouvimos o barulho dos aplausos e fomos para o Hotel completamente desapontados, então chamaram nosso manajé e olha: ‘vem aqui na CBS pra você ver como o telefone não para. E um monte de cartas aqui dizendo que os indígenas venceram. Vocês ganharam. Depois de perder, ganharam’.

“E nós pensando que não, que 18 milhões de pessoas tinham visto o programa. Nos contrataram. Depois os dólares estavam caindo pelos bolsos, já não tinha mais onde botar. Aluguei um apartamento no meio de Nova Iorque, no meio daqueles edifícios grandes. O disco que não havia dado sucesso começou a dar sucesso e vendemos mais de 1 milhão de discos”

A partir daí, os irmãos se tornaram figura carimbada no show business americano. Apresentavam-se em clubes, hotéis e cassinos tocando música clássica vestidos de smoking na primeira parte e música popular na segunda, vestidos com trajes indígenas americanos estilizados.

A um dado momento, eles também começaram a cantar em português, inglês e espanhol e as suas vozes são bastante respeitáveis. Isso demonstra que então, como hoje, música puramente instrumental só ocasionalmente pode garantir um sucesso comercial.

Nas décadas de 60 e 70 eles fizeram turnes imensas pela Europa e América e voltavam anualmente para o Japão. Isto serviu de pretexto para a gravação de vários discos lá, alguns deles contendo arranjos de músicas japonesas. Em 1971 Mussapere se casou com uma jovem japonesa chamada Mitiko.

Ela admirava e admira demais a arte dele e disse que estudar com ele era como estudar pintura com Rembrandt.

“Tive três antes, tive que divorciar. Lá nos Estados Unidos dá um trabalho se divorciar, se gasta muito dinheiro. Estou contente há mais de 30 anos”.

Em meados da década de 70, Herundi, o irmão mais novo, abandonou a carreira e resolveu se dedicar a causas ecológicas no interior do Brasil. 

“Ele faleceu a uns 10 anos atrás. Ele se enjoou. Não quis mais tocar. O manajé nosso morreu e ele acusou isso para ir embora. Fez uma casa muito bonita, perdeu o interesse de fazer entrevistas, não gostava de tirar mais tantas fotografias. Quem tem dinheiro fica um pouco abusado”.

Registro de Ramachrisna Parente da Costa

Show dos índios Tabajaras nos EUA em novembro 1977
Show dos índios Tabajaras nos EUA em novembro 1977
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show indios tabajaras4

Por Monique Gomes

Empreendedora digital, copywriter,
analista de SEO on-page, gestora de tráfego.

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2 comentários em “A fantástica história dos indígenas Mussaperê e Herundi”

  1. Juarez Malavazzi Jr

    Olá Monique boa tarde. Por causa dos Indios Tabajaras acabei chegando até você. Nessa louca aventura que tem sido tentar contar essa história em um documentário que venho realizando desde 2004. Como jornalista tem muita informação em sua matéria que são absolutamente corretas. E apenas gostaria de pedir que adicionasse o crédito de meu filme (https://www.youtube.com/watch?v=tdYF5gZckmk ) que você colocou em uma matéria da Folha Ubajarense. Agradeço a divulgação de meu trabalho, mas nesses tempos de internet, citar a fonte e dar crédito são uma maneira de preservar o direito autoral, principalmente de imagem, como no caso do vídeo. Estou à sua disposição para qualquer dúvida. Estive de 2004 a 2009 junto com Nato Lima, ajudando-o a realizar os dois últimos sonhos dele. Produzi o seu único disco solo na carreira “Serenading to Michiko” e que acabou sendo o seu último registro musical. E esse documentário é uma homenagem póstuma a esse virtuoso da música internacional.

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