Todos nós acompanhamos o caso do professor que usou um trecho da música Beijinho no Ombro, da cantora Valesca Popozuda, em uma questão na prova de filosofia. O assunto bombou nas redes sociais, foi notícia em alguns jornais e eu questionava: cadê a fala do professor? Enquanto ele não se pronunciava, fiquei na torcida que ele revelasse o motivo daquela questão pelo mesmo fato que me motivaria a fazê-lo.
Na condição de professora, eu teria colocado uma questão como aquela para destilar o meu sarcasmo. É, seria um protesto, uma lição de moral, caso meus alunos fossem desatentos, desinteressados. Seria como uma espécie de código que, descodificado, ficaria assim: ”Vocês não prestam atenção nas aulas, mas duvido que errem uma pergunta dessa, seus merdinhas!”.
Como diz Maria Rita, ‘só quem ardeu na fogueira sabe o que é ser carvão’. Os professores sabem o quanto é difícil manter a atenção dos alunos durante todo o tempo da aula – esse tema é complexo, mas, resumindo: a educação precisa urgente de um upgrade similar ao do novo estúdio de redação do programa Fantástico, da rede globo. Pois bem, quando o bendito professor finalmente foi entrevistado, veio a decepção. Aquele papo de que foi proposital pra chamar a atenção da imprensa, da questão do preconceito contra o funk, pura balela. É muito mais cabível que ele tenha feito isso pelo mesmo motivo que eu faria, mas ficou com vergonha de declarar.
Ora, se está na boca do povo, é cultura. Mesmo que inútil. Se o professor achar que deve levar para a sala de aula é porque o assunto tem potencial para render um caloroso debate, mas não foi o que aconteceu. Tudo isso só serviu para vender a música de uma pseudofeminista – uma verdadeira feminista não sai por aí chamando uma mulher de inimiga, invejosa, periguete,recalcada, entre outros rótulos pejorativos.
Não tenho nada contra as popozudas – até porque o meu não é tão pequeno… mas o fato é que, ainda que exista um mérito pela criação de um conceito sobre o termo ‘beijinho no ombro’ e por mais efêmero que isso seja, os verdadeiros “pensadores contemporâneos” são, segundo o Pai Google, os compositores Wallace Vianna, André Vieira e Leandro Pardal – o que faz de Valesca uma mera emissora. É mais ou menos como atribuir uma citação de Clarice Lispector a Gretchen…
E outra… vivemos aterrorizados com tanta violência, bala perdida, bala com endereço certo, incêndio em ônibus… por que engrandecer uma música na sala de aula que fala “Bateu de frente é só tiro, porrada e bomba”, desprezando o potencial que essa mesma música teria em um debate sobre os caminhos que devemos trilhar para uma cultura de paz?